Pela loucura ou pela sanidade

Deixo-lhe esta carta, como um coringa em suas mãos. É uma saída, não muita satisfatória, para a dor que, provavelmente, causei.
Queria explicar-lhe por que eu fui sem avisar. Dizer o porquê da minha ida repentina ao mundo desconhecido que é a morte, ou a vida após ela.
Eu não sei se você lembra, quando eu disse que tinha crises de asma, sempre que você estava distante. Era verdade! Nunca menti pra você. Nem quando disse que estava na rua com minha mãe. E acho que essas crises eram, basicamente, psicológicas. Eu nunca gostei de me sentir só. Ficava sem ar.
Quando mamãe morreu, então... Meu mundo parecia ter desabado. Não tinha mais ninguém, só você. Na semana da morte dela, eu tinha crise quase toda hora, lembra? E no dia do velório? Eu fiquei internada!
Não me julgue ainda. Você pode dizer que eu poderia ter ido a um médico, a um clínico geral ou, até mesmo, a um psiquiatra. Mas eu fui! Você não soube, porque vivia se ausentando.
Não gostaria que se culpasse pela minha morte de maneira dolorosa, apenas se culpe.
Eu ficava desesperada sem você. Nunca tivemos filhos e isso me deixava mais louca ainda. A idéia de que eu não tinha ninguém para deixar minha história, minha bagagem, minhas marcas, dar um tapa nas costas e dizer: "Vai viver enquando eu descanso". Sim, essa idéia me enlouquecia.
E hoje, meu amor, hoje eu me senti a pessoa mais sozinha de todo o universo. Pois eu te vi com outra. Meu Deus! Solidão maior não há.
Você chegou ao ponto de me trocar, de desfazer a aliança que tinhamos. E sem ela, eu não tinha mais nada. A psicóloga tentou me falar sobre Deus. Eu nem sei, tomara que Ele tenha piedade de mim. Mas eu não aguento mais essa dor, esse sofrimento em vão.
É tudo passageiro, um dia vou ficar só de vez e espero que seja agora.
Eu te amo muito e te perdôo. Foi pela loucura ou pela sanidade que eu morri.

Luisa Albuquerque

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3 Comentário(s)

  1. Loquita, eu gosto não só do que escreve...mas, especialmente do jeito que escreve. Incisivo, machuca, transpassa a pele. Putz!

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  2. outro, eu ou nós. eu quero é sentir!!! tá na "bença"!

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  3. Solidão condenada
    devora devagar...
    É parte dolorosa
    Faz parte de tudo,
    de todos nós...
    Pensar...
    Reagir...

    Bjosss

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